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Deixa a vida me levar

O terreiro da vida, para Zeca Pagodinho, é um palco onde ele apenas deixa o corpo dançar no compasso do que vier.

"Deixa a vida me levar, vida leva eu" — canta ele, como quem entrega os remos ao destino, com um sorriso e uma gelada na mão.

Para muitos, soa como a receita da leveza: viver sem o peso das expectativas, sem o tormento de querer controlar tudo.

Mas será que essa filosofia do "deixa rolar" encontra eco nas profundezas do Taoísmo — e também na vigilância rigorosa da Filosofia?


No Taoísmo, sim.

Há uma ressonância quase perfeita com o espírito do refrão de Zeca.

O Tao — essa força invisível que permeia o mundo — não exige esforço, nem resistência.

Ele apenas é.

E a sabedoria, segundo Lao Tzu, está em fluir com ele, não contra.

É o princípio do wu wei— agir sem forçar, fazer sem interferir, mover-se como a água contorna a pedra: com paciência e sem luta.

O bambu que se curva ao vento sem quebrar...

O velho que sorri diante da mudança...

O silêncio que ensina mais do que mil discursos...


Tudo isso ecoa a mesma confiança que há na voz do Zeca:

quem disse que controlar tudo é sabedoria?

Mas aí vem a Filosofia — com seus olhos atentos e suas perguntas cortantes.

Ela não aceita tudo tão fácil.

Ela quer saber: e se, ao "deixar a vida nos levar", estivermos apenas à deriva?

E se, em nome da leveza, estivermos abrindo mão da liberdade?

Sartre, por exemplo, diria que estamos "condenados a ser livres".


Ou seja: mesmo quando não escolhemos, estamos escolhendo.

Não há neutralidade.

Nossa existência é construída por nossos atos — ou pela ausência deles.

Abdicar das rédeas pode ser também abdicar de si.

Até mesmo os estoicos, mestres da serenidade, fariam uma ressalva.

Sim, devemos aceitar o que não controlamos.

Mas não é porque o mar é indomável que vamos deitar no barco e dormir.

O que importa é como reagimos, o que cultivamos, o que pensamos.

Virtude, para eles, é remar com sabedoria — mesmo quando o vento sopra contra.


Então talvez o ponto não seja escolher entre fluir ou comandar.

A arte da vida está no discernimento.

Saber quando remar.

E saber quando é hora de largar os remos e confiar.

A vida é um rio.

Tem corredeiras e tem trechos mansos.


Zeca nos lembra que soltar o corpo é preciso.

Sartre nos avisa que viver é decidir.

E o Tao sussurra que o mais sábio é aquele que sabe escutar o ritmo das águas — e responder a ele com leveza e lucidez.


Idalo Spatz

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