Iluminismo x Iluminado
- Idalo Spatz
- 2 de out.
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No Arpoador, quando o sol começa a tombar devagarinho sobre o mar, há uma luz que não vem do céu — vem de dentro. É o tipo de claridade que não se mede em lúmens nem se explica com gráficos. Ela apenas… se espalha.
A gente chama isso, às vezes, de iluminação. Mas cuidado. Iluminação mesmo, daquela que pacifica, não costuma sair das lâmpadas do Iluminismo.
Sim, o Iluminismo — essa alvorada racional que nos ensinou a confiar na lógica, a duvidar da fé, a erguer impérios sobre a razão e demolir catedrais com argumentos.
Um movimento poderoso, necessário, sem dúvida. Mas talvez um pouco... orgulhoso demais da própria lâmpada.
Voltaire, Diderot, Kant. Homens que enfrentaram a escuridão da ignorância com tochas acesas por palavras. Mas talvez esquecessem que a luz mais profunda não é a que cega as trevas. É a que revela o que nelas habita.
Kant escreveu: “O esclarecimento é a saída do homem de sua menoridade.”
Mas Lao Tsé, bem antes disso, sussurrou outra coisa: “Conhecer os outros é inteligência; conhecer a si mesmo é sabedoria.”
O iluminismo quer explicar. O iluminado não tem pressa.
O primeiro desenha o mapa. O segundo... caminha.
O Iluminismo gritava “Sapere aude!” — ouse saber.
O Taoísmo sussurra “Wu wei” — aja sem agir.
E talvez o verdadeiro saber esteja entre esses dois extremos: entre o farol que rasga a noite e a lanterna que apenas acompanha os passos.
Na praia, um homem lê Descartes ao pôr do sol. “Penso, logo existo.” Mas o mar devolve outra frase, na espuma: “Sinto, logo não preciso provar.”
É que a existência não é um problema a ser resolvido, mas um mistério a ser vivido. E nisso, os iluministas se debatiam, enquanto os iluminados… flutuavam.
O Iluminismo tentou organizar o mundo com réguas. O Tao apenas deixou que o mundo fluísse.
No fundo, a diferença entre o Iluminismo e o Iluminado é a mesma entre luz artificial e luar. Um força a visão. O outro, aguça o silêncio.
E quem sabe, um dia, a filosofia desça do púlpito e caminhe descalça na areia, sem querer convencer ninguém, apenas... entender.
Não para vencer a ignorância com argumentos, mas para acolhê-la como parte do caminho.
Como diria Camus: “A lucidez é o sol do espírito, mas também pode queimar.”
E talvez seja o Tao, com seu passo de nuvem e sua paciência de rio, que venha ensinar que ver claro... nem sempre é enxergar bem.
Idalo Spatz


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